Aos livros ele olhava, como quem com fome estava diante da comida. Eram uma espécie de alimento que o faltava a sua alma - dizia ele. Pão não faltava a sua casa, mas livro era uma besteira que seus pais achavam desnecessária adquirir para além aos utilizados na escola.
Era um filho obediente mas teve de aprender a mentir aos seus pais, fazia isso para poder ir à biblioteca. Sua mãe ficou satisfeita quando ele disse que toda terça e quinta, entre 14hs e 17hs iria à igreja. A desculpa da igreja logo se tornou desnecessária, arrumou um bico como entregador de uma farmácia, ia pelo menos uma hora por dia à biblioteca. No fim da primeira quinzena de trabalho recebeu conforme o combinado, que juntando às gorjetas lhe deu muita satisfação e ao mesmo tempo um sentimento de impotência. Sabia que não podia comprar livros, praticar um esporte ou fazer um curso de idiomas, pois corria o risco de apanhar em casa só de voltar em insistir nisto (sim, já havia tentado convencer seus pais que tais coisas não eram futilidades).
Apenas depois de um ano e meio, quando terminou seu ensino fundamental já quase com 16 anos é que contou aos pais que precisou mentir a eles por tanto tempo. Não importava muito, pois ele havia conseguido passar ao Colégio Naval graças estas mentiras. Talvez um outro garoto contaria aos pais porque mentiu com a expressão de um certo desprezo mas, ao contrário daquilo a que se poderia imaginar, ele pediu desculpas e agradeceu seus pais por tê-lo ajudado em sua conquista.
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